Por quanto tempo me escondi do mundo? Envolvido num sopro de vento, por quanto tempo deixei de ser sopro para ser vento? Agora que percebi como minha constituição se assemelha a terra, ao pó, argila, não posso deixar de querer derramar água em mim para unificar-me. É o vento que seca o barro molhado. É no vento que eu voo longe, busco o pólen e o canto de outro passarinho.
Talvez assim eu possa um dia me tornar um lindo vaso chinês, ou um muro rígido como meus ossos. Há dias que minha consistência é como carne crua de peixe, sem fibras e insípida. Noutros, tudo o que sei que sou, e o que não sei também, adquire formato fino, transparente e muito atraente.
Posso mastigar meus pensamentos sem me importar com meu corpo. Não sem me perguntar: por quanto tempo me escondi do mundo, engolindo esses pensamentos como pedras improváveis de se triturar? Como pode uma mente que se liquefaz e derrama-se junto ao sangue, se expele com a urina, aparentemente estar escondida?
Neste ponto, as minhas janelas produziam uma penumbra imensa dentro de mim. Sobre as minhas duas esferas negras, e muito eficientes ao enxergar o mundo, as cortinas do pensamento permaneciam intactas e frias. O sol, enfim, não podia alcançar a lã do tapete, tampouco meus dedos que descansavam sobre uma cama vazia. Vinte dedos, sozinhos.
Então, subitamente, algo acontece que me torna menos eu, menos indivíduo. Torno-me amplo como o céu da Turquia! Branco como o gelo da Antártida! Isso só me remete a uma explicação: meu ser, mais do que nunca, necessita construir a sua própria casa, não mais basta ser único porém tão dividido. Quer amor.
Ao pensar, como o vento, meu ser torna-se um grão de terra seco. Ao sentir, como a água que é minha amada, torna-se barro.
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